terça-feira, 29 de janeiro de 2008

E quando pensava que este dia seria para descanso, eis que...

Como raio este dia chegou até este ponto??
A foto é parte do "princípio do fim" do dia. E é apenas o aperitivo!
(nota: daqui para a frente, se deixarem o cursor do rato sobre uma foto, podem ler a legenda da mesma)
Um dia que até começou "bem"... tive a cena da emigração de que falei no post anterior (se não leram, vão ver agora mais abaixo porque com este são dois que publico hoje e convém ler a primeira parte do episódio). Acabei por ficar preso no barco com o resto da tripulação e aproveitei para ir escrever um pouco no blog ou dormir mais umas horas (acordei às seis para ir à Emigração).
Quando ia a caminho da minha cabine cruzei-me com uma dançarina inglesa muuuuito jeitosa (como seria de esperar de uma dançarina) e muito simpática cuja cabine é ao lado da minha. Era uma das vozes que ouvia quando estava, feito puto, de castigo naqueles primeiros dois dias. Cruzámo-nos à porta da enfermaria (que estava fechada a essa hora) e ela precisava de uma coisa nossa antes de ir para os ensaios. Disse-lhe que só depois das cinco da tarde, que era quando iríamos abrir de novo a enfermaria. Ficou desolada. Aproveitei o momento para socializar e fomos na conversa até às nossas cabines. Há que tirar proveito de todos os momentos para conhecer pessoas novas, principalmente vizinhas giras, já que nestes quatro dias fui um rato de cabine e depois fui promovido a rato de enfermaria. Já na minha cabine achei que poderia ajudá-la. Até porque estava de folga e porque tenho as chaves da enfermaria... só me faltava a password de acesso ao sistema informático. Liguei para lá e a Rika atendeu-me. Fixe! Acabámos por descer até lá com outro dançarino (americano) que também precisava de qualquer coisa.
Já não consegui voltar para cima com eles porque fiquei a ajudar a Rika com as toneladas de burocracias e papeladas que um surto deste tipo envolve. É que uma cena assim mete os gajos do Center for Disease Control and Prevention (vulgo CDC) e eles são implacáveis. Creio que eram estes que no filme "Outbreak" queriam lançar uma ogiva nuclear sobre a cidade americana que estava com um surto de Ebola. E aí está a bela da paranóia americana a funcionar. É uma nação, "carago"!
Já depois do almoço, perto da hora em que os novos passageiros iam começar a embarcar no cruzeiro de 5 dias que começava hoje (Mobile - Cozumel - Calica - Mobile), encontrei a dançarina loirinha e simpática de novo. Estava a conversar com uma colega à porta de uma cabine antes da minha. Continuava vestida com a mesma roupa desta manhã. Mas a colega estava de calças e soutien, de costas para mim. Respeitador como sou, passei, sorri e cumprimentei-as de novo, mas não olhei para a senhora semi-nua por quem passei. Quando estava já com a chave enfiada na fechadura elas chamaram-me. Achei que, já que iam falar comigo, a tal dançarina em soutien voltariria para dentro da cabine dela ou que tentaria esconder-se um pouco mais. E lá fiz o "sacrifício" de voltar-me e ficar de frente para a tal rapariguinh-.... RAPARIGONA! Cruzes credo! A senhora era... como é que se diz em português... MAMALHUDA como tudo! Fiquei precupado e com medo de não conseguir manter o olhar fixo no dela enquanto falava comigo! É que os meus olhos estavam com uma estranha tendência de descer constantemente, não compreendo porquê! Não se mostrou nada preocupada por estar em soutien à minha frente. E também eu rapidamente fiquei sem preocupações quanto a isso. :)
Só depois deste episódio reparei no nome que tinha sobre a porta: Captain of Dance - seguido do nome e alcunha que, adequadamente, era "Tits". Pelos vistos o busto avantajado já lhe tinha dado uma alcunha e tudo. Ainda bem que não fui só eu quem reparou! ;)
Novo visual de oficial da Carnival: sem barba e de goatee
Voltei para a enfermaria e eis que recebemos uma chamada na linha de emergência. Um passageiro recém-chegado tinha caído no Lido Deck e estava a respirar com dificuldade. Saímos em passo bem rapidinho, com o nosso trolley de emergência, a Rika e eu. Num instantinho chegámos ao Lido Deck e lá estava o senhor. Pormenores clínicos fora, foi só oxigénio, cadeira de rodas e toca de ir rapidinho para a enfermaria. Chamámos o médico pelo rádio no caminho, para encontrar-se connosco na enfermaria e avisar o comandante para não partir enquanto não tivessemos o doente evacuado para um hospital.
Correu tudo bem e lá foi ele, levado por paramédicos que vieram de ambulância buscá-lo ao navio. Podia ter sido muito pior se estivessemos em alto-mar, fora do alcance dum helicóptero. Era a morte do artista. Assim ele conseguiu chegar rapidinho a uma unidade hospitalar antes sequer de ter feito uma hora desde o início da sintomatologia. No entanto, por esta altura, já eu começava a pensar se sou alguma espécie de amuleto de má sorte a bordo. É que num local onde as coisas mais graves que acontecem são pessoal enjoado por causa das ondas e quedas com pés torcidos à beira da piscina não era suposto haver coisas como surtos epidémicos e doenças graves a bordo.
Como ainda estava de "folga" e estava sem uniforme, fui à cabine mudar de roupa. Ainda fui buscar a minha nova placa de identificação à nossa management staff assistant (MSA).
A minha placa de identificação. Gosto tanto de ver ali NURSE - PORTUGAL
Cheguei à enfermaria e a Rika estava a fazer um penso a uma ferida numa perna duma velhota que levou com uma mala doutra passageira. Continuo a trazer "sorte" ao navio e ocupantes!
Sentado ao computador a escrever a ficha da doente recebo uma chamada no telefone 911, o das emergências. Um outro passageiro estava a sentir-se mal na cabine. De trolley atrás acorri ao homem. Avaliei-o e decidi levá-lo para a enfermaria. Meti-o numa cadeira de rodas e toca a despachar para onde tivesse equipamento e ajuda.
Para a segurança do doente teria de ser desembarcado. Mas já estavamos em andamento e não havia como voltar atrás porque não é possível dar a volta ao navio dentro do canal. A solução passava por evacuar o doente numa lancha da guarda costeira. Sem grandes pormenores a acrescentar, mandaram-me fazer uma mala pequena, o mais rápido possível, e preparar-me para deixar o navio e acompanhar o doente até terra. Mais tarde teria alguém a dizer-me o que seria feito de mim, já que no navio não iria parar e seguiria rumo a Cozumel. Mas para já, ia sair do navio sem saber o que raio ia ser de mim quando chegasse a terra e o doente estivesse entregue.
Chamou-se a Sierra Team (o nome de código para "stretcher team", para não alarmar os passageiros) e chegou a lancha da guarda costeira norte-americana. Foi a loucura! Colete salva-vidas, mala de emergência e desfibrilhador automático externo, passaporte, autorização de desembarque dos serviços de emigração, dinheiro no bolso, bagagem (com pouca roupa porque o portátil onde estou a escrever ocupa 80% do espaço da mala) e pulei para dentro da lancha.
Agora já sabem como cheguei a isto... mas esperem para ver como termina!
Agora já percebem o contexto da foto. Foi a loucura! A lancha estava amarrada ao navio, mas ele continuava em marcha e via-se a ondulação a passar por nós a uma velocidade que metia respeito.
Há imagens que temos de considerar uma dádiva e um privilégio...
Tive o privilégio de ver o Holiday de um ponto de vista que poucos devem ter experimentado. É lindo, não é?
Enquanto a lancha se afastava a todo o gás, mesmo a acelerar à bruta, fiquei cá fora na plataforma com o doente na maca, sob um monte de cobertores. Ao contemplar aquela imagem do Holiday a ficar para trás, não consegui conter o sorriso. Nem há um mês atrás vivia enfiado num buraco, num serviço de urgência com uma tremenda carga de trabalho que exigia uma força sobrehumana... e agora estava aqui, em alta velocidade numa lancha, com um doente e dois paramédicos ao meu lado, com um colete salva-vidas nos ombros e um desfibrilhador na mão. Que explosão de adrenalina! Espectacular e indescritível misto de emoções!
Avisaram-me que demoraríamos cerca de 20 minutos a chegar ao porto mais próximo áquela velocidade. O doente estava estável e sem queixas. A voz dele mantinha-se calma e isso tranquilizou-me.
Inesquecível...
Observei o Holiday a afastar-se e mantive a mão no ombro do doente para tentar transmitir-lhe segurança e a sensação de que tinha alguém ali do lado dele. Foi um momento que nunca vou esquecer...
Chegados ao porto, nem cinco minutos tivemos de esperar pela ambulância. Grande carrão! Já tinha visto ambulâncias destas nos filmes e até num simulacro na IC19 (os bombeiros de Carcavelos têm umas poucas que só usam em desfiles porque são para aí 4000cc de cilindrada e a gasolina), mas nunca tinha estado dentro de uma. É espectacular! Parece um autocarro, super espaçosa, super confortável e, acima de tudo, muito prática e equipada à altura. Um verdadeiro luxo.
Foi aí que encontrei a minha futura ex-mulher. Da ambulância saíu uma paramédica loirinha, muito gira, discreta e com uns olhos verdes lindos! E tão simpática!
Aqui está um gajo orgulhoso do uniforme que enverga!
Ainda tive tempo para que um dos paramédicos da lancha me tirasse uma foto para imortalizar o momento. Há bacalhaus que se metem em aventuras do caneco!
Ainda demorámos uns bons 30 a 40 minutos a chegar ao hospital. Vim o caminho todo a ver a paramédica gira a fazer o trabalho dela. Fiquei impressionado. Fez tudinho! Espectacular colheita de dados com o doente e, ao reparar que ele tinha umas extrassístoles ventriculares relativamente frequentes, até lhe fez um ECG de 12 derivações. Fui metendo conversa e fiquei a saber que nasceu e cresceu em Mobile, tem 25 aninhos e está no 3º ano de enfermagem. Quem diria! Devo ter alguma pancada por alunas de enfermagem que andam em ambulâncias! Adora viajar e já fez uns 5 cruzeiros, todos pela Carnival! Aprendi ainda que o curso de paramédico são 2 anos. É verdade que Portugal ainda está muito longe de atingir este nível em emergência pré-hospitalar. Principalmente no que toca à apresentação das paramédicas! ---claro que tu estás excepcionalmente bem cotada e representas muito bem a classe, Betinha! ;) ---
Chegámos ao hospital e o doente foi entregue em segurança. Estável, actualmente sem queixas e a salvo. Se o estado dele se agravasse já fora do alcance duma evacuação de helicóptero seria muito grave. Mas correu tudo bem e era o que se queria. Tudo acabou da melhor maneira.
Já no hospital tinha uma carrinha à minha espera e uma reserva para o hotel onde estou agora a escrever este post. Tenho duas opções daqui para a frente: ficar aqui 5 dias até o cruzeiro terminar e o Holiday estar de regresso a Mobile ou ir de avião até Cozumel e apanhar o navio de novo daqui a dois dias. A decisão não depende de mim e serei contactado por uma coordenador da Carnival amanhã para me dizer o que será de mim esta semana. Sinceramente, sendo que fiquei com o número de telefone e email da paramédica para irmos sair, prefiro ficar por Mobile!
Ainda por cima estou num hotel de luxo, com piscina, internet wireless grátis e tudo do melhor.
A foto não faz jus à categoria da piscina
Duas gigantescas camas de casal
Digam-me vocês: devo ficar ou devo ir e juntar-me de novo ao navio em Cozumel? ;)
Como diria a minha avó: baidozito de esterco!
P.S.: cheguei a dizer-vos que não pago nem alimentação nem alojamento enquanto estiver à espera que o navio regresse? :)

3 comentários:

Unknown disse...

Ainda só se passaram uns dias e já andas na conversa com vizinhas em soutien, já tens contactos de futuras enfermeiras em Mobile... e tudo sempre com muito respeito e profissionalismo!!
És o maior...

Um abraço Bishop

elisabete disse...

Sr. enfermeiro giro em grande e a esbanjar charme por onde passa...
Parece que a opinião que me tinham passado sobre as bailarinas é bem real e ainda por cima são as vizinhas de cabina...parece-me que tens uma cabine num lugar bem privilegiado.

Esta a parecer-me que esse conhecimento de paramédicas estudantes de enfermagem é fetiche...lol

Um beijo grande, poderoso!

Anónimo disse...

Ainda não falaste de UMA morena jeitosa que tenhas aí encontrado!! Só loiras?????????